sexta-feira, 21 de dezembro de 2012

Relação da Escatologia com o Restante da Dogmática

1. CONCEPÇÕES ERRÔNEAS QUE OBSCURECEM ESTA RELAÇÃO. Quando Kliefoth escreveu sua Escatologia (Eschatologie), queixou-se do fato de que até então nunca aparecera um compreensivo e adequado tratado de escatologia de maneira completa; e depois chamou a atenção para o fato de que nas obras dogmáticas aparece muitas vezes, não como uma das principais divisões e uniforme em relação a estas, mas apenas como um apêndice fragmentário e tratado com negligência, enquanto que algumas das suas questões são discutidas noutros loci isto é, noutras partes. Havia boas razões para as suas reclamações. Em geral se pode dizer que, mesmo agora, a escatologia é o menos desenvolvido de todos os loci da dogmática. Além disso, com freqüência se lhe dá um lugar muito subordinado no tratamento sistemático da teologia. Coccejus (Cocceio) cometeu o erro de dispor o conjunto global da dogmática segundo o esquema das alianças, e assim a tratou como um estudo histórico, e não como uma apresentação sistemática de todas as verdades da religião cristã. Nesse esquema, a escatologia só poderia aparecer como “finale” da história, e de modo nenhum como um dos elementos constitutivos de um sistema de verdade. Uma discussão histórica das ultimas coisas pode fazer parte da historia revelationis (história da revelação), mas, como tal, não pode ser apresentada como parte integrante da dogmática. A dogmática não é uma ciência descritiva, e, sim, normativa, na qual visamos à verdade absoluta, e não a uma simples verdade histórica. Os teólogos reformados (calvinistas) em geral viam este ponto com muita clareza, e, portanto, discutiam as últimas coisas de maneira sistemática. Todavia, nem sempre lhe fizeram justiça como uma das principais divisões da dogmática, mas lhe deram um lugar subordinado num dos outros loci. Vários deles a concebiam como tratando apenas da glorificação dos santos ou da consumação do governo de Cristo, e a introduziam na conclusão da sua discussão da soteriologia objetiva e subjetiva. O resultado foi que algumas partes da escatologia receberam a devida ênfase, ao passo que outras partes foram pouco menos que negligenciadas. Nalguns casos, o conteúdo da escatologia foi repartido entre diferentes loci. Outro erro, que alguns cometeram, é que perderam de vista o caráter teológico da escatologia. Não podemos subscrever a seguinte declaração de Pohle (católico romano) em sua obra sobre A Escatologia, ou a Doutrina Católica das Últimas Coisas (Eschatology, or the Catholic of the Last Things): “A escatologia é antropológica e cosmológica, antes que teológica: pois, embora trate Deus como o Consumador e Juiz Universal, estritamente falando, o seu assunto é o universo criado, isto é, o homem e o cosmos”. Se a escatologia não fosse teologia, não teria lugar próprio na dogmática.
2. O CONCEITO CORRETO DESTA RELAÇÃO. Estranhamente, o mesmo escritor católico romano diz: “A escatologia é a coroa e o selo da teologia dogmática”, o que está perfeitamente certo. É o único lócus ou ponto da teologia no qual todos os outros loci chegam a um ponto culminante, a uma conclusão final. O doutor Kuyper assinala corretamente que cada um dos outros loci deixa alguma questão sem resolver, a que a escatologia deve dar uma resposta. Na teologia propriamente dita a questão é sobre como Deus é final e perfeitamente glorificado na obra das Suas mãos, e como se realiza plenamente o conselho de Deus; na antropologia, a questão sobre como a ruinosa influência do pecado é dominada completamente; na cristologia, a questão sobre como a obra de Cristo é coroada com a vitória perfeita; na soteriologia, a questão sobre como a obra do Espírito Santo por fim resulta na completa redenção e glorificação do povo de Deus; e na eclesiologia, a questão da apoteose final da igreja. Todas essas questões devem encontrar em sua resposta no derradeiro lócus da dogmática, fazendo deste o verdadeiro selo da teologia dogmática. Haering atesta o mesmo fato, quando diz: “De fato, ela (a escatologia) derrama calara luz sobre cada segmento doutrinário particular. A universalidade do plano divino de salvação, a comunhão pessoal com um Deus pessoal asseverada sem reserva, a significação permanente do Redentor sustentada, o perdão do pecado entendido como unido à vitória sobre o poder do pecado – sobre estes pontos a escatologia deve tirar toda dúvida, mesmo quando exposições indefinidas, feitas nas partes anteriores, não possam ser logo reconhecidas como tais. Tampouco é difícil descobrir a razão disto. Na doutrina das últimas coisas, a comunhão entre Deus e o homem é exposta como completada, e, daí, a idéia de nossa religião, o princípio cristão, é apresentado em sua pureza; não, porém, como uma simples idéia no sentido de um ideal jamais concretizado completamente, mas como uma realidade perfeita – e é evidente, que dificuldades estão implícitas nisso! Portanto, dever-se-á no fim, na apresentação da escatologia, senão mais cedo, que a realidade desta comunhão com Deus recebeu o que lhe é devido irrestritamente.”
(Berkhof, L – Teologia Sistemática Pg 669)

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