sexta-feira, 21 de dezembro de 2012

O Estado Intermediário não é um Estado de Provação ou Prova Posterior

1. EXPOSIÇÃO DA DOUTRINA. A teoria da “segunda prova”, assim chamada, encontrou considerável apoio no mundo teológico do século dezenove. Ela é defendida além de doutros, por Mueller, Dorner e Nitzsch na Alemanha, por Godet e Gretillat na Suíça, por Maurício, Farrar e Plumptre na Inglaterra, e por Newman Smythe, Munger, Cox, Jukes e vários outros teólogos de Andover nos Estados Unidos. Essa teoria pretende que a salvação mediante Cristo é possível no estado intermediário para certas classes de pessoas, ou talvez para todas; e que é oferecida nos mesmos termos como no presente, a saber, a fé em Cristo como Salvador. Cristo é dado a conhecer a todos os que ainda necessitam dele para a salvação, e todos são instados a aceita-lo. Ninguém é condenado sem ser submetido a esta prova, e só são condenados os que resistem a esta oferta da graça. O estado eterno do homem não será fixado irrevogavelmente enquanto não chegar o dia do juízo. A decisão tomada entre a morte e a ressurreição decidirá se a pessoa será salva ou não. O principio fundamental sobre o qual repousa essa teoria é que nenhum homem perecerá sem receber o oferecimento de uma oportunidade favorável para conhecer e aceitar a Jesus. O homem só é condenado por sua obstinada recusa a aceitar a salvação oferecida em Jesus Cristo. Contudo, as opiniões diferem quanto às pessoas às quais a graça divina oferecerá a oportunidade de aceitar a Cristo no estado intermediário. A opinião geral é que certamente será estendida a todas as crianças falecidas na infância e aos pagãos adultos que nesta vida não ouviram falar de Cristo. A maioria sustenta que será concedida até mesmo aos que, tendo vivido em terras cristãs, na presente vida nunca consideraram apropriadamente as reivindicações de Cristo. Há, ainda, grande diversidade de opiniões quanto à instrumentalidade e aos métodos pelos quais essa obra salvadora será levada a efeito no futuro. Além disso, enquanto alguns alimentam as maiores esperanças quanto aos resultados dessa ora, outros são menos entusiasmados em suas expectativas.
2. FUNDAMENTO EM QUE SE BASEIA ESTA DOUTRINA. Essa teoria se funda, em parte, em considerações gerais daquilo que se poderia esperar do amor e da justiça de Deus, e num desejo facilmente compreensível de dar à obra da graça de Cristo Jesus amplitude tão inclusiva quanto possível, e não nalgum sólido alicerce escriturístico. Sua principal base bíblica acha-se em 1 Pe 3.19 e 4.6, com o entendimento de que estas passagens ensinam que Cristo, no período compreendido entre a Sua morte e a Sua ressurreição, pregou aos espíritos no hades. Mas estas passagens dão um fundamento assaz precário, visto que permitem uma interpretação completamente diferente. E mesmo que estas passagens ensinassem que Cristo de fato foi ao mundo subterrâneo para pregar, Seu oferecimento de salvação se estenderia somente aos que tinham morrido antes da Sua crucificação. Eles se referem também a passagens que, em sua opinião, apresentam a incredulidade como a única base para a condenação, tais como, Jo 3.18, 36; Mc 16.15, 16; Rm 10.9-12; Ef 4.18; 2 Pe 2.3, 4; 1 Jo 4.3. Mas estas passagens só provam que a fé em Cristo é o único meio de salvação, o que de modo nenhum equivale a provar que uma consciente rejeição de Cristo é a única base da condenação. A incredulidade é, sem dúvida, um grande pecado, pecado que sobressai em proeminente destaque nas vidas daqueles a quem Cristo é pregado, mas não é a única forma de revolta contra Deus, nem a única base da condenação. Os homens já estão sob condenação quando Cristo lhes é oferecido. Outras passagens, como Mt 13.31, 32; 1 Co 14.24-28; Fp 2.9-11, são igualmente inconclusivas. Algumas delas provam demais e, portanto, nada provam.
3. ARGUMENTOS CONTRA ESTA DOUTRINA. As seguintes considerações podem ser dirigidas contra essa teoria: (a) A Escritura descreve o estado dos descrentes após a morte como um estado fixo. A passagem mais importante a considerar aqui é Lc 16.19-31. Outras passagens são Ec 11.3 (de interpretação incerta); Jo 8,21, 24; 2 Pe 2.4, 9; Jd 7.13 (comp. 1 Pe 3.19). (b) Invariavelmente descreve também o juízo final vindouro como determinado pelas coisas feitas na carne, e nunca fala dele como de algum modo dependente do ocorrido no estado intermediário, Mt 7.22, 23; 10.32, 33; 25.34-46; Lc 12.47, 48; 2 Co 5.9, 10; Gl 6.7,8; 2 Ts 1.8; Hb 9.27. (c) o principio fundamental dessa teoria, segundo o qual unicamente a consciente rejeição de Cristo e Seu Evangelho leva os homens a perecerem, é antibíblico. O homem está perdido por natureza, e mesmo o peado original, bem como os pecados atuais, o torna digno de condenação. A rejeição de Cristo é, indubitavelmente, um grande pecado, mas nunca é apresentada como o único pecado que leva à destruição do pecador. (d) A Escritura nos ensina que os gentios perecem, Rm 1.32; 2.12; Ap. 21.8. Não há na Escritura nenhuma evidencia em que possamos basear a esperança de que gentios adultos, ou mesmo crianças gentílicas que não chegaram aos anos da discrição, serão salvos. (e) A teoria da prova futura leva à extinção de todo o fervor missionário. Se os gentios podem decidir quanto à aceitação de Cristo no futuro, isso só pode resultar num juízo mais rápido e maior para muitos, se são postos ante a escolha agora. Por que não deixa-los na ignorância pelo Maximo de tempo possível?
QUESTIONÁRIO PARA PESQUISA: 1. É sustentável a posição de que o sheol-hades sempre designa um mundo subterrâneo para onde vão todos os mortos? 2. Por que é objetável a crença em que a Bíblia, em suas afirmações sobre o sheol e hades, simplesmente reflete as noções populares da época? 3. Devemos supor que, por ocasião da morte, os justos e os ímpios entram nalguma habitação temporária e provisória, e não imediatamente em seu destino eterno? 4. Em que sentido o estado intermediário é apenas transitivo? 5. Como surgiu a noção do purgatório? 6. Como os católicos romanos concebem o fogo purgatorial? 7. Esse fogo é meramente purificador, ou também penal? 8. Que bom elemento alguns luteranos vêem na doutrina do purgatório? 9. Que mescla de heresias encontramos na seita conhecida como “aurora do milênio”? 10. O estado intermediário, de acordo com a Escritura, representa um terceiro aion entre o aion houtos e o aion ho mellon? 11. a ênfase escriturística ao presente como “o dia da salvação” está em harmonia com a doutrina de uma prova futura?
BIBLIOGRAFIA PARA CONSULTA: Bavinck, Geref. Dogm. , p. 655-711; Kuyper, Dict. Dogm., De Consummatione Saeculi, p. 25-116; Vos, Geref. Dogm. V, Eschatologie, p. 3-14; Hodge, Syst., Theol. III, p. 713-770; Shedd, Dogm. Theol. II, p. 591-640; Dabney, Syst. and Polem. Theol., p. 823-829; Litton, Introd. to Dogm. Theol., p. 548-569; Valentine, Chr. Theol. II, p. 392-407; Pieper, Christ. Dogm. III, p. 574-578; Miley, Syst. Theol. II, p. 430-439; Wilmers, Handbook of the Chr. Rel., p. 385-391; Schaff, Our Father’s Faith and Ours, p. 412-431; Row, Future Retribution, p. 348-404; Shedd, Doctrine of Endless Punishment, p. 19-117; King, Future Retribution; Morris, Is There Salvation After Death?; Hovey, Eschatology, p. 79-144; Dahle, Life After Death, p. 118-227; Salmond, Chr. Doct. Of Immortality, cf. Índice; Mackintosh, Immortality and the Future, p. 195-228; Addison, Life Beyond Death, p. 200-214; De Bondt, Wat Leert Het Oude Testament Aangaande Her Leven Na Dit Leven?, p. 40-129; Kliefoth, Christl. Eschatologie, p. 32-126.
(Berkhof, L – Teologia Sistemática Pg697)

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